quarta-feira, 30 de setembro de 2009

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quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Meus trabalhos.







                                                           Tecnica mixta sobre papel.


Oleo sobre tela.


terça-feira, 22 de setembro de 2009

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Amerínda anos 90.


 
 
 
 
 
 
 
 
 

domingo, 20 de setembro de 2009

Reproduzi a matéria na integra.
Porque continua atualissima!!!!

Considerações em torno de uma mostra realizada pelo MARCO
24/10/2007

Com o título Panorama – 30 Anos da Divisão do Estado, O Museu de Arte Contemporânea de Mato Grosso do Sul – MARCO, incluiu em sua programação uma mostra de artes plásticas que procura “refletir” o “processo de modelação contínua da identidade plástica sul-mato-grossense”. A curadoria “formatou a mostra em quatro módulos: artistas da tradição, geração anos 80, geração anos 90 e artistas a partir do ano 2000.” (PANORAMA, 2007, n.p.) Logo, é anunciada a preocupação de construir um painel geral das artes plásticas nos trinta anos de existência de Mato Grosso do Sul.

O Catálogo produzido para o evento não é melhor nem pior do que o material distribuído nessas ocasiões. Nele a crítica da curadoria do evento, marcada pelas paráfrases, diz as mesmas coisas já ditas por outros críticos. Discurso doutoral, mas inócuo. A apologia domina. As frases e orações apelam para termos e expressões rebuscados, mas são mal construídas logicamente. Pretensioso do ponto de vista formal, revela profunda ignorância histórica.

Para exemplificar, o período introdutório é ilustrativo.

Nesses trinta anos de Mato Grosso do Sul fomos desenhando, num ritmo muito peculiar, um perfil social que traduz nossa vocação para uma heterogenia identitária, assimilando do lugar estratégico entre fronteiras geográficas tão marcantes, elementos que se tornaram importantes e necessários para a construção de repertórios culturais repletos de valores e nuances de sentidos. (PANORAMA, 2007, n.p.)

A forma bacharelesca não esconde a análise vazia, inteiramente avessa ao rigor científico, pois não se faz acompanhar de dados verificáveis que atestariam a validade dos juízos emitidos.

Há muito tempo venho me incomodando com essa situação, pois tal discurso é revelador, em especial, de um autoritarismo e de uma presunção que faz o comum dos mortais acreditar ser imensa sua ignorância e que a ele não foi dado o dom de entender as coisas do espírito, sobretudo a arte. Isto afasta as pessoas simples das instituições que deveriam ter como uma de suas missões difundir a cultura para todos. Nada mais avesso à necessidade democrática de disseminar o conhecimento aos empobrecidos sul-mato-grossenses e brasileiros.

Para ser justo, reconheço que esse não é um traço típico da crítica em nossa terra. Pelo contrário, é uma característica presente no mundo das artes plásticas, que transformou esse terreno, inteiramente dominado pelo pós-modernismo, em algo onde vale tudo; onde o oportunismo dos marchands e das galerias de arte se sobrepôs aos critérios estéticos; onde o discurso consagra o aspecto “transgressor” da arte e do comportamento de seus artífices, mas se reduz a uma postura política reacionária só preocupada, na prática, com a mercantilização dos produtos de artistas, muitas vezes inexpressivos e, eles próprios, produzidos por artifícios de mercado.

Mesmo não comungando com todas as teses do autor, sugiro a leitura de um livro sobre a matéria que todo amante das artes plásticas e do conhecimento deveria ler. Trata-se de Desconstruir Duchamp: arte na hora da revisão (SANT´ANNA, 2003). Duchamp foi um desses “artistas transgressores”, um mistificador que fez da esperteza, associada ao oportunismo dos marchands e à ignorância cultural dos compradores de artes, um grande negócio. Não por acaso, Affonso Romano de Sant´Anna, o autor do referido livro, é demonizado por marchands, galeristas e artistas ditos modernos e pós-modernos.

Não sou crítico de arte nem pretendo sê-lo. Simplesmente, gosto das artes plásticas. Talvez de uma forma obsessiva, o que não me causa qualquer desgosto. No ano de 1993, uma parte de minha coleção foi exposta no Espaço Cultural Banco do Brasil, em Campo Grande. Intitulada O olhar do outro, no dia da abertura da mostra eu disse para a imprensa que não fazia distinção entre um livro, uma tela, um desenho ou uma escultura. Para mim, todos eles são registros do real. Na condição de professor-pesquisador da área de história da educação, os livros sempre foram cultivados por mim como fontes de conhecimento, como instrumentos fundamentais para a reconstituição, em pensamento, da unidade do real. Por isso, constituí uma boa biblioteca. Também por isso, constituí uma boa coleção de artes plásticas, exatamente ao longo do período abordado pela mostra exposta no MARCO.

É na condição de um cidadão interessado em artes plásticas que me dou ao direito de escrever essas anotações. Não tenho qualquer predisposição pessoal contra as figuras que possam se sentir atingidas pelas críticas aqui veiculadas. Aliás, não vejo a situação exposta como resultado intencional das ações de pessoas singulares. Esse quadro está sendo produzido numa escala que vai muito além de Mato Grosso do Sul. As pessoas envolvidas, entre nós, simplesmente deixam-se enredar pelo jogo e o reproduzem no dia a dia. Eu ficaria feliz se elas, ao invés de uma reação indignada, se dispusessem a refletir sobre o papel deseducativo que exercitam ao fazerem o que vêm fazendo.

Quanto à mostra Panorama – 30 Anos da Divisão do Estado, apesar do que tenta justificar a curadoria do evento, reduz-se a um resultado onde domina a desorganização, o improviso e a falta de critério.

Lacunas há muitas, mas nenhuma tão injustificável quanto a referente a Wega Nery, pintora corumbaense recém-falecida. Aliás, na sua própria terra, a crítica vem teimando em ignorar essa que foi a mais celebrada artista plástica de Mato Grosso do Sul. Que não venham com argumentos de que muito cedo ela se afastou do Estado, que se tornou uma estranha à sua terra de nascimento, pois, segundo o seu próprio testemunho, Wega nunca se desligou de suas raízes sul-mato-grossenses, o que se revela nas suas paisagens imaginárias de onde emergem formas abstraídas de seu querido Pantanal. Foi a ela que Drummond se dirigiu comovido, depois de ver uma de suas exposições, em 1983, afirmando que sua “arte veio iluminar magicamente os meus 80 anos” (Apud WEGA Nery, 1987, p. 7). Entre seus prêmios mais importantes, não podem deixar de ser mencionados a Medalha de Bronze no Salão Nacional de Belas Artes, em 1950; Melhor Desenhista Nacional na IV Bienal de São Paulo, em 1957; Medalha de Prata no VIII Salão Paulista de Arte Moderna, em 1957; Prêmio Aquisição na VII Bienal de São Paulo, em 1963, e Prêmio Amistad Artística Americana na II Bienal Americana de Arte de Córdoba, Argentina, em 1964. Em 1963 teve uma Sala Especial na VII Bienal de São Paulo, o que se repetiu na décima primeira e na décima segunda versões do mesmo evento, nos anos de 1971 e 1973. Se já participara de diversas coletivas, até então, desde 1955 começou a expor individualmente em galerias das principais cidades do Brasil. De 1965 em diante, por meio de mostras individuais, seu talento passou e ser conhecido e reconhecido em centros internacionais como Montevidéu, Buenos Aires, Washington, Nova York, Paris, México, Munique e Londres. Suas telas se fazem presentes em expressivas galerias do mundo, nas mais importantes coleções particulares do Brasil e circulam, sistematicamente, nos mais concorridos leilões de arte do País. Portanto, Wega já era uma artista consagrada bem antes de Humberto Espíndola ter-se tornado “o embrião” da “tradição nos movimentos artísticos” da década de 1970, segundo o Catálogo do Panorama. A constatação não representa demérito para Espíndola, mas, sim, o questionamento de certa interpretação muito difundida que, ao personificar nele o papel de “embrião”, acaba sugerindo ter sido o mentor da bovinocultura a célula original das artes plásticas em Mato Grosso do Sul. É lícito reconhecer que Espíndola foi o único artista mato-grossense que se consagrou junto à crítica em escala nacional na década de 1970, fruto tanto de seu profissionalismo quanto de sua articulação política. Mas “embrião” não foi só ele. Não há “movimento” de uma única figura. Entre os seus contemporâneos, companheiros de jornada, alinham-se outros nomes expressivos como Ilton Silva e Jorapimo. Até mesmo Ignês Correa da Costa, uma das pioneiras das artes plásticas em nossa terra, falecida em 1985, não pode ser descartada desse conjunto inicial dos movimentos da década de 1970.

Artistas primitivistas de primeira linha foram igualmente ignorados no Panorama, apesar das expressivas presenças de Isaac Saraiva e Juraci Mello. Entre os olvidados eu poderia citar Cecílio Vera, prêmio aquisição no IV Salão de Artes Plásticas de Mato Grosso do Sul e menção honrosa na Mostra da Arte Ingênua e Primitiva de Piracicaba de 1991. Além de Cecílio Vera, não foram relacionados outros artistas que freqüentam os salões patrocinados pelo SESC/Piracicaba, onde se realizam as mais importantes mostras de arte primitiva no Brasil. Estão entre eles, por exemplo, Sidney Fernando Nofal e Ramão Lopes. Deve ser incluído, ainda, o nome de Marcelo Ivanhez, prêmio revelação na Bienal de Naïfs do Brasil em sua edição de 2000. Poderiam ser apontados, igualmente, Joubert Pantanero, Da Silva e Tita.

Entre os artistas ascendentes no âmbito da pintura moderna sul-mato-grossense, foram omitidos alguns expoentes do movimento guaicuru. Fundado por Henrique Spengler, Silvio Rocha e Adilson Schieffer, esse movimento incluiu, em seguida, Cleir. Mais tarde, outros artistas se agregaram, ao mesmo tempo em que ocorriam defecções. Contudo, as referências históricas sobre os personagens fundadores estão todas embaralhadas e incorretas nas publicações da área. Desses fundadores, é inconcebível a omissão de Sílvio Rocha, o artista que melhor expressou a decomposição da cultura indígena, no Estado, por força de sua assimilação pela sociedade capitalista. Da mesma forma, Adilson Schieffer mereceria um lugar nessa mostra, pois vem pintando, continua e consistentemente, telas marcadas pelo lirismo e pela nostalgia, que captam valores, costumes e práticas indígenas. A preferência da curadoria se concentrou sobre o artista plástico de menor expressão do núcleo inicial, Henrique Spengler, cujos desenhos reproduzem, meramente, grafismos baseados em matrizes buscadas, talvez, em Kadiwéu, de Darcy Ribeiro (1980). Em contrapartida, Spengler sempre merecerá ser reconhecido como a voz e o principal ideólogo do movimento guaicuru.

É notória, ainda, a ausência injustificável de pintores que construíram consistentes e reconhecidas trajetórias de produção no Estado. Claro que, numa mostra, a curadoria enfrenta a necessidade de usar critérios de seleção que nem sempre pleiteiam a todos, mas excluir todos os nomes já referidos e os listados a seguir é acintoso. Sem a preocupação de ser exaustivo, reporto-me, por exemplo, a Kátia Ângelo, a Luiz Xavier de Lima, a Darwin, a Lelo, a Richard, a Lúcia Monte Serrat, a Daltro, a Rubén Dario, a Marlene Mourão, a Masahiko Fujita, a Laila Zahran, a Heron Zanata, a Júlio Cabral, a Thetis Sellingardi, a Ton Barbosa e a Terezinha Neder. Poderiam alongar a lista os escultores Conceição dos Bugres, nossa mais expressiva e conhecida artista primitivista, Índio, Sandro, Anor, Denise Nachif e Nantes.

Na categoria dos omitidos merece referência, ainda, o pontaporanense Francis Bernard, cuja obra, parece, tornou-se desconhecida em Mato Grosso do Sul. Além de suas pinturas abstratas, precisariam ser referidas, pela relevância imanente, as telas relativas aos imigrantes, da década de 1980, e as expostas numa mostra realizada em Paris no final do ano de 1998. Uma tela dessa última fase foi reproduzida na Rev. Arts Croisés (no. 9, dez.1998 a jan.1999, p. 12), onde afloram os valores e os ícones culturais indígenas, tão presentes no berço fronteiriço do artista. Em Mato Grosso do Sul alguns colecionadores dispõem de pinturas de ambas as fases. É injustificável o ostracismo que o provinciano meio artístico sul-mato-grossense impôs a esse que é um dos mais talentosos artistas de nossa terra.

Incoerências também atravessam o Panorama. Mas nenhuma tão gritante quanto aquela que atingiu Ilton Silva, o “mais mato-grossense de nossos artistas plásticos”, segundo o judicioso depoimento de outro amante das artes visuais, o saudoso Ricardo Brandão. Tão relevante foi o labor do artista, entre nós, que foi agraciado com o título de cidadão campo-grandense, concedido pela Câmara Municipal de Campo Grande. Infelizmente, as condições materiais de existência obrigaram Ilton Silva, ele que é uma das forças mais criativas de nossas artes plásticas, a evadir-se para o sul do Brasil. Pintor prolífero, grande parte de sua obra permanece em nosso meio, inclusive as telas premiadas nos salões de Mato Grosso do Sul. A curadoria do Panorama poderia ter levantado, junto a colecionadores, os nomes dos proprietários dessas obras e incluído na mostra as mais expressivas. O que se vê na exposição é um contra-senso. As telas não pecam pela falta de qualidade, mas pelo foco espacial equivocado. Elas compõem a Série Litoral, a fase mais recente do artista, e continuam centradas sobre as condições de vida dos trabalhadores, mas, agora, referidas ao espaço litorâneo da região sul e não ao seu Estado de origem. O fato de, no Catálogo, ter sido reproduzida a foto da expressiva tela A luz e o cavalo, de 1982, ausente na mostra, é mais outra ocorrência insólita e inexplicável.

Outros artistas de primeiro plano nas artes plásticas em Mato Grosso do Sul não foram pleiteados com a exposição de conjuntos harmoniosos de obras relevantes. Cito o conjunto referente a Jorapimo, que tem ao lado de seu primoroso Barco no camalote, de 1986, uma paisagem pantaneira que nada acrescenta ao seu par. Telas centradas no Casario do Porto de Corumbá, nas paisagens ribeirinhas, nas lavadeiras, nos pescadores e nos peões, algumas de suas temáticas mais recorrentes e expressivas, poderiam ter ilustrado com maior amplitude e riqueza a obra produzida pelo mais festejado artista plástico do pantanal sul-mato-grossense. O conjunto referente à obra de Beto Lima, da mesma forma, é puxado pela excelente tela Pólo sul, de 1993, premiada, no mesmo ano, em Salão de Artes Plásticas do Estado. Mas a complementação poderia se restringir a Tentação, de 2000, e a algum floral. Suas diversas fases estariam, assim, melhor pleiteadas. As três outras telas de Beto Lima, incluídas no Panorama, estendem exageradamente o espaço concedido a esse artista e nada acrescentam em relevância e nível ao conjunto. Fiquei frustrado por não ter visto, com o destaque merecido, os coletes de jacarés e os mapas do paraíso de Jonir Figueiredo.

Artistas de segunda e terceira importância, alguns completamente desconhecidos e inexpressivos, receberam destaque injustificável no Panorama. Numa mostra como essa deveria existir maior rigor na seleção dos participantes. A própria justificativa para a inclusão “de uma nova leva de artistas”, é pouco cabível e precária. Diz o texto da curadoria:

A partir de 2000, nota-se a nítida mudança na atitude de fazer de uma nova leva de artistas. Com a transferência do MARCO para a sede definitiva, em 2002, grandes possibilidades foram vislumbradas devido às dimensões do espaço físico que permitiu aos artistas uma maior dinâmica para a concepção de seus trabalhos. Estamos então diante de uma situação marcada pela tentativa de abandono das linguagens tradicionais, dando vazão à curiosidade e proposição de outros mecanismos de expressão. São artistas que tentam freqüentemente desenvolver pesquisas e experimentações em sintonia com o tempo presente: ousar é a palavra chave, investigar é a solução. (PANORAMA, 2007, n.p.)

Além de ser muito problemática a idéia de que o mero surgimento de um espaço físico apropriado possa determinar uma reorientação das artes plásticas numa região, mais do que em qualquer outro trecho do discurso, aqui se revela o modismo pós-modernista, a presunção de que o que se faz hoje é mais avançado e ousado do que o que se fez antes. Contudo, o momento presente, longe de questionar os paradigmas do passado, é a celebração da falta de paradigmas, é, inclusive, a consagração do charlatanismo, pois qualquer coisa esdrúxula passa a ser considerada arte. A justificativa baseada na idéia de que os artistas vêm praticando a “tentativa de abandono das linguagens tradicionais” é somente retórica que tenta escamotear esse fato. Muitos dos pretensos artistas, que, interesseiros, engrossam o coro de tal proselitismo, desaparecem tão rapidamente quanto surgem. Quem quiser ter uma idéia mais objetiva disso, reveja os catálogos das mostras coletivas realizadas por artistas de Mato Grosso do Sul nos últimos trinta anos. A esmagadora maioria teve a existência dos raios. Essa mesma situação por certo irá se repetir com muitos dos integrantes do Panorama.

Mesmo afirmando a falta de critério na seleção das obras e dos artistas, não quero deixar de reconhecer as virtudes do Panorama. Aliás, já pontuei a importância de algumas pinturas contidas na mostra. Não falarei de figuras consagradas em Mato Grosso do Sul, pois é muito fácil obter “consagração” por aqui. Mas há personagens que, há muito tempo, vêm produzindo de forma contínua e consistente – insisto nesses dois termos – e que, com justiça, se fazem presentes. Sempre sou tomado por sentimentos e emoções de enlevo, por intenso prazer estético em face das obras de artistas como Genésio Fernandes, Edson Castro, Humberto Espíndola, Julio Alvarez, Lu Sant´Anna e Vânia Pereira, além dos demais já referidos. Mesmo sendo uma artista sazonal, foi com prazer que revi as pinturas de Mary Slessor. Essa artista, infelizmente, jamais conseguiu recuperar o nível de realização de suas obras iniciais, produzidas na década de 1970. Sensibilizou-me, também, a tela Ar revolto II de Carlos Nunes.

Se esse foi o quadro constatado na exposição intitulada Panorama – 30 anos da Divisão do Estado, em outra sala do MARCO se realiza mostra que reúne as obras de Humberto Espíndola incluídas na Série Divisão de Mato Grosso. Além de ser uma das fases mais expressivas do artista, houve cuidado na sua montagem, enriquecida com a inclusão de instrumentos informativos sobre cada tela. São textos que esclarecem aos visitantes, tanto os veteranos amantes das artes, quanto os neófitos, aí incluídos os escolares, pormenores relativos à composição e à simbologia de cada tela. A exposição ganha, assim, um caráter educativo que deveria ser parâmetro para todas as demais no futuro.

Do ponto de vista histórico, essa mostra é um registro que ajuda a compreender a divisão de Mato Grosso. Não do posto de vista imediato, pois o artista também foi um personagem do processo e, nele, tomou partido, o que se revela mesmo no exame superficial de cada tela. Mas, mediatamente, com o recurso da teoria, as telas de Espíndola falam e ajudam a iluminar as determinações mais recônditas da autoritária e draconiana decisão do Governo Militar. Tal registro iconográfico há muito tempo deveria ter sido difundido tanto nas escolas do ensino básico quanto nas universidades, onde pode se tornar, inclusive, objeto de pesquisa. Em boa hora o MARCO dá uma relevante contribuição cultural ao torná-lo mais conhecido.

Quanto à crítica que introduz o catálogo da mostra, mais uma vez, se constatam impropriedades históricas que muito lembram, de uma forma empobrecida, o processo denominado por Hobsbawn de “invenção das tradições”. O texto repete o discurso da curadoria do Panorama, ou o que leva ao mesmo resultado, o texto da curadoria do Panorama repete o discurso da presente crítica. Este fato só confirma o juízo de que a crítica de arte cede lugar às paráfrases. Se não, vejamos. Humberto Espíndola é louvado como “o primeiro artista do Centro-Oeste brasileiro a se projetar nacionalmente, é responsável pela descentralização da arte brasileira, chamando a atenção da melhor crítica de arte brasileira para fora do eixo São Paulo - Rio.” (SÉRIE ..., 2007, n.p.)

Esse tipo de interpretação, além de não promover Humberto Espíndola, desserve a história das artes plásticas em Mato Grosso do Sul. Revela, também, total desconhecimento das trajetórias da produção artística fora do “eixo São Paulo - Rio”, pois desconsidera os movimentos encetados no sul, no nordeste, em Minas Gerais e, até mesmo, no vizinho Estado de Goiás. O discurso é provinciano, daí sua grandiloqüência e ufanismo. Vê grandezas imaginárias em acontecimentos fabricados pelas armadilhas de análises idealistas. Afundados nos sertões de Mato Grosso do Sul, região que não se encontra no epicentro do desenvolvimento econômico-cultural, alguns de seus viventes começam a ser traídos por um localismo que se envaidece com as grandezas inventadas por um pensamento delirante. Essa é a tragédia do regionalismo, do nacionalismo, do terceiro-mundismo e de outros ismos semelhantes.

Infelizmente, em que pesem os esforços de artistas como Humberto Espíndola, para o Brasil as artes plásticas em Mato Grosso do Sul correspondem a um terreno marcado pela ausência. Não pela qualidade intrínseca do que produzem nossos artistas, mas eles são desconhecidos. Se desconhecidos, inexistem. Raramente vemos suas obras expostas em galerias de outras regiões brasileiras. Também não os vemos nos catálogos de leilões, os instrumentos que definem os preços dos produtos artísticos no mercado. Também por isso, falar em valores de peças de arte, entre nós, é falar de cotações arbitrárias.

Não vejo como uma desgraça o reconhecimento desse precário estágio de desenvolvimento das artes plásticas em Mato Grosso do Sul. Pelo contrário, é da consciência desse estágio que poderemos criar recursos para a sua superação. Espero que as pessoas entendam ter sido o escopo dessa minha análise a preocupação de tirar da letargia o ambiente que cerca esse domínio entre nós. O debate se faz necessário como primeiro passo para o reconhecimento de que “o rei está nu”. Esse reconhecimento é o pré-requisito para a instauração de um outro produtivo debate, na seqüência, visando criar as condições para a articulação dos produtores de arte do Estado, para um movimento de promoção das nossas artes plásticas como um todo, bem como para a instauração de políticas públicas cuja execução não pode ter a marca do paternalismo nem ficar cativa de interesses corporativos ou de grupos restritos que atuam no meio artístico.

Fontes:

ARTS croisés, Paris, França, n. 9, dez.1998/jan.1999, p. 12.

HOBSBAWM, Eric e RANGER, Terence (1997). A invenção das tradições. 3.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 316 p.

PANORAMA – 30 anos da Divisão do Estado (2007). Campo Grande, MS: Museu de Arte Contemporânea de Mato Grosso do Sul – MARCO. n.p. (Catálogo)

RIBEIRO, Darcy (1980). Kadiwéu: ensaios etnológicos sobre o saber, o azar e a beleza. Petrópolis, RJ: Vozes. 318 p.

SANT´ANNA, Affonso Romano de (2003). Desconstruir Duchamp: arte na hora da revisão. Rio de Janeiro: Vieira & Lent. 202 p.

SÉRIE Divisão de Mato Grosso: Humberto Espíndola. Campo Grande, MS: Museu de Arte Contemporânea – MARCO, n.p. (Catálogo)

WEGA Nery: reflexos do real invisível. s.l.: MWM-IFK, (1987). 246 p.

Gilberto Luiz Alves é Doutor em História da Educação pela UNICAMP, pesquisador e professor universitário, colecionador de artes plásticas.